20.4.09

Beta-bloqueadores no perioperatório de intervenções cirúrgicas não cardíacas – os novos dados do estudo POISE

No dia 13 de maio a revista britânica The Lancet publicou, em seu site os resultados do estudo POISE e com isso iniciou um intenso debate que envolveu médicos, repórteres e pacientes. O estudo POISE é, até agora, o maior estudo clínico já realizado para investigar o papel dos beta-bloqueadores no perioperatório de intervenções cirúrgica não-cardíacas. Os mais de 8.000 indivíduos incluídos foram aleatorizados para receber metoprolol ou placebo. É importante salientar que somente as intervenções cirúrgicas eletivas foram analisadas e pacientes que já faziam uso de beta-bloqueador por outras razões, não foram incluídos neste estudo. Com relação aos desfechos cardiovasculares, como morte cardíaca e infarto não fatal, o POISE revelou resultados semelhantes aos estudos anteriores com menos pacientes: o grupo que recebeu metoprolol apresentou incidência de complicações significativamente menor do que o grupo controle. Por outro lado, o que chamou a atenção dos investigadores foi o resultado da análise dos desfechos secundários, morte por todas as causas e acidente vascular cerebral (AVC). Nesta análise, os pacientes que receberam metoprolol apresentaram taxas maiores de complicações. Segundo os autores, a hipotensão e a bradicardia, mais frequentes no grupo que recebeu metoprolol, teriam sido responsáveis pela maior ocorrência de complicações, em especial AVC. A interpretação desses dados fez os investigadores do POISE concluírem que o uso de metoprolol no ambiente perioperatório é capaz de reduzir a chance de complicações cardiovasculares, MAS a um custo muito elevado: aumento da chance de morte ou de AVC. Os autores do trabalho acrescentaram que as recomendações relativas ao uso de beta-bloqueadores contidas nas diretrizes de tratamento perioperatório deveriam ser reformuladas. O editorial que acompanha o artigo recomenda, entretanto, cautela com relação a esta decisão. Aponta problemas com relação à escolha da dose de metoprolol adotada pelo estudo POISE (100 mg na primeira dose, atingindo 200 mg por dia) ou seja, 50% da dose máxima permitida para esse medicamento. Segundo o editorial, esta dose é muito mais alta do que a utilizada em estudos anteriores, o que poderia explicar a ocorrência de hipotensão e bradicardia. De fato, a análise dos dados do POISE, incluindo o material adicional oferecido pelos autores e disponível no site da revista, revela que não foi desprezível o número de pacientes que desenvolveu hipotensão e bradicardia. Hipotensão e bradicardia, embora possam representar complicações potencialmente graves, quando prontamente reconhecidas e tratadas por meio de suspensão do beta-bloqueador e medidas para elevação da freqüência cardíaca e da pressão arterial, não estão associadas a elevações significativas de taxas de complicações. Estas conclusões provêm de estudos com pacientes na fase aguda do infarto agudo do miocárdio onde os beta-bloqueadores têm seu benefício comprovado, mesmo numa situação onde a hipotensão e bradicardia poderiam reduzir perfusão coronariana e aumentar o tamanho do infarto. Como lidar então com as informações do POISE aparentemente contraditórias aos conceitos arraigados e, mais importante, em conflito com a fisiopatologia das complicações cardiovasculares e com os mecanismos de cardio-proteção dos beta-bloqueadores? Mais uma vez, com cautela. Aqui vão algumas recomendações:

1. Os indivíduos em uso prévio de beta-bloqueador não foram incluídos no POISE. Este indivíduos NÃO devem ter o beta-bloqueador suspenso antes de intervenção cirúrgica não cardíaca.

2. TODOS os indivíduos que fazem uso de beta-bloqueadores no perioperatório de intervenções cirúrgicas não cardíacas devem ser rigorosamente monitorizados com relação à ocorrência de hipotensão e bradicardia. Caso uma destas complicações seja diagnosticada, o medicamento deve ser prontamente suspenso e devem ser estabelecidas medidas para sua correção.

3. Enquanto aguardamos análise mais detalhada dos dados do estudo POISE, recém publicado, as recomendações relativas ao uso de beta-bloqueadores no perioperatório de intervenções cirúrgicas não cardíacas devem ser mantidas.

Bruno Caramelli
Daniela Calderaro
Pai Ching Yu
Danielle Menosi Gualandro
Andre Coelho Marques

17.3.09

Alteração no perfil de coagulação e incidência de TVP em colecistectomia laparoscópica

Embora a colecistectomia laparoscópica parecer ser menos traumática aos pacientes, comparada à cirurgia aberta, a diminuição do retorno venoso dos membros inferiores e a hipercoagulabilidade que ocorre em pacientes submetidos à colecistectomia laparoscópica eletiva com pneumoperitônio por CO2 torna-se um fator de risco potente para a ocorrência de trombose venosa profunda (TVP).

 

Pesquisadores publicaram, recentemente, no International Journal of Surgery, um estudo observacional de 50 pacientes submetidos à colecistectomia laparoscópica eletiva, desenhado para avaliar alterações de TP, TTPa, D-dímero e antitrombina III, que foram medidos no pré-operatório, 6h e 24h após a cirurgia. Os pacientes foram acompanhados por ultrassom colorido duplex dos membros inferiores bilateralmente e no 7º pós-operatório para procurar por evidências de TVP.

 

Diminuição significativa pós-operatória de TTPa e de antitrombina III sugeriram ativação da coagulação, enquanto que a diminuição do D-dímero sugeriu ativação da fibrinólise. Valores de TP não apresentaram alterações estatisticamente significativas pós-operatórias. Idade, índice de massa corpórea e duração do pneumoperitônio correlacionaram-se à ativação significativa da coagulação e da fibrinólise. Nenhum paciente desenvolveu evidências clínicas ou radiológicas de TVP no período pós-operatório.

 

Os pesquisadores concluíram que o pneumoperitônio por CO2 aumenta a ativação da coagulação e da fibrinólise associadas à colecistectomia laparoscópica. Pacientes com fatores de risco como idade avançada, obesidade ou com expectativa de longa duração de cirurgia laparoscópica tendem a ter ativação significativa da coagulação, tornando-os um grupo de risco vulnerável ao desenvolvimento de TVP no pós-operatório, justificando a utilização de alguma forma de tromboprofilaxia.



Uma resenha de Alteration in coagulation profile and incidence of DVT in laparoscopic cholecystectomy - International Journal of Surgery; 2008 Dec 25. [Epub ahead of print]


Caso deseje receber o trabalho na íntegra, por favor contacte nosso serviço de Informações Médicas pelo nosso site ou através do 0800 7030015.

As resenhas são baseadas em artigos de periódicos nacionais e internacionais que contenham informações médicas com aplicabilidade prática.

Copyright ® 2008: São Paulo Medical Conferences - Todos os direitos reservados sobre a resenha em português.
"O conteúdo desta página é de responsabilidade da São Paulo Medical." 

2.2.09

Antibiotic Prophylaxis Against Infective Endocarditis: New Guidelines, New Controversy?

Richard G. Bogle; Abhay Bajpai

Br J Cardiol.  2008;15(6):279-280.  ©2008 Medinews (Cardiology) Limited
Posted 01/12/2009
Introduction

For over 50 years cardiologists have routinely recommended antibiotic prophylaxis (ABP) at the time of dental procedures in patients deemed to be at risk of infective endocarditis (IE). Reviews and editorials all acknowledged the lack of robust evidence for effectiveness of ABP and from time to time the literature has been reviewed and expert opinion synthesised into guidelines. In the UK, the 2004 Joint Royal College of Physicians/British Cardiac Society guideline has been widely followed.[1] In 2006 new guidelines were published by the British Society for Antimicrobial Chemotherapy (BSAC).[2] These guidelines were important because this committee's recommendations are incorporated into the British National Formulary. The BSAC guidelines recommended withdrawal of ABP for the majority of patients limiting them to individuals perceived to be at the highest risk of IE (e.g. a prior history of IE, prosthetic cardiac valves and surgically constructed pulmonary or system shunts/conduits). These guidelines were welcomed by the majority of dentists and microbiologists as a step in the right direction. However, many cardiologists, who had seen first-hand the horrors of IE, did not wish to see the rejection of a therapy that was thought by most to be effective and harmless. The lack of agreement between the medical and dental professions resulted in the issue being referred to the National Institute for Health and Clinical Excellence (NICE) for an authoritative statement.[3]

NICE Guidance

The NICE review tried to determine which cardiac conditions are associated with increased risk of IE; whether dental treatment is associated with acute risk of developing the condition and whether ABP was effective in prevention of cases and deaths. The NICE guideline concluded that patients with structural heart disease were at increased risk of IE but did not find convincing evidence that dental ABP was cost-effective. They calculated that if amoxicillin prophylaxis was effective then the cost of preventing a single case of IE would be circa £12 million. In the absence of high-quality evidence for clinical effectiveness they recommended that routine dental ABP should be abandoned. The methodology employed by NICE was robust and transparent, in contrast to the evidence supporting ABP. The NICE guidelines development group usually review therapies supported by data from mega-trials and meta-analyses, however, the literature on ABP is more like the Dead Sea scrolls - fragmented, imperfect, subject to various interpretations and mainly missing. In this situation there is a strong reliance on expert opinion and many would agree that absence of evidence should not be regarded as evidence of absence. The poor quality of the supportive data and reliance on expert opinion probably explains the differences between the BSAC and American Heart Association/American College of Cardiology (AHA/ACC) guidelines and those of NICE. The NICE guideline development process is transparent and the comments from stakeholders are published. Review of these comments shows that the dental community is generally in favour of the new recommendations, which reinforce the link between good overall dental hygiene and prevention of IE rather than relying on ABP just at the time of dental work. Other stakeholders are concerned not only with the guideline itself but potential difficulties with implementation. In this respect the Department of Health stated that the guidelines were a "very significant shift in current clinical practice... we feel there is a serious risk of confusion and lack of compliance".

Reaction

The reaction to these guidelines has been predictable. Many cardiologists see them as a step too far and question the credibility of a guideline that is based around the reevaluation of weak historical evidence rather than high-quality clinical trials. To many cardiologists the case supporting ABP is simple: IE is a very serious disease with a high mortality and morbidity; decades of clinical experience have illustrated that certain patients are at increased risk; dental work is associated with bacteriaemia and antibiotics kill bacteria cheaply, effectively and with low toxicity. Most cardiologists acknowledge the lack of definitive evidence for effectiveness but believe that even if ABP prevents only a minority of IE, surely this is preferable. It is for these reasons we believe that most cardiologist are uneasy about the new guidelines. Of course we may never be able to measure the precise effectiveness of ABP and this uncertainty was acknowledged more than 25 years ago by Celia Oakley and Walter Somerville who hypothesised at least four reasons why ABP might fail:[4]

  • Perhaps it was not given.

  • Perhaps it was not given to the right people.

  • Perhaps it does not work.

  • Perhaps it is irrelevant.

Now that the guideline has been published various scenarios and difficulties may be envisaged. For example, if a cardiologist continues to recommend ABP for a patient but the dentist wants to follow the NICE guidelines. Each clinician has a separate duty of care to the patient and both may feel they are acting within the patient's best interest. While the view expressed by the cardiologist is a valid consideration, legally it is not definitive and would only be taken as part of the overall 'mix' of information. The Dental Protection organisation has already advised their members that if a cardiologist continues to recommend ABP it is inadvisable, as it conflicts with guidelines issued by an authoritative body; this recommendation holds even if it has been confirmed in writing by the cardiologist.[5]

The Art of Medicine

A survey of cardiologists, prior to the publication of the NICE guidelines, showed that 94% felt that patients with moderate risk of IE should receive ABP and 96% believed that it was unsafe not to recommend ABP to such patients prior to dental treatment.[6] With such overwhelming support for the status quo what is the legal position of the cardiologist who decides to act against the guideline? The Bolam defence stated that a doctor is not guilty of negligence if "he has acted in accordance with a practice accepted as proper by a responsible body of medical men skilled in that particular art".[7] Since NICE is a national body appointed by statute it is likely to be regarded as a responsible body. Although NICE guidelines are not enforceable in law the threat of legal action might lead cardiologists, while not agreeing with the guidelines, to comply with them since any potential legal action could be robustly defended. However, compliance with guidelines due to a fear of litigation could, in time, weaken the Bolam defence due to a lack of variation in practice. Over 2,000 years ago, Plato explored the difference between skills grounded in practical expertise and those based solely on following instructions or obeying rules. He argued that once the medical profession dedicates itself to the provision of healthcare through guidelines it is committed to continue observing them because, at that point, the expertise resides within the guidelines rather than the clinician. Once this occurs then any guideline deviation is unjustifiable on the basis of clinical judgement.

In clinical cardiology we are used to facing decisions where the clinical evidence base does not completely apply to the particular patient at hand. In this situation we give an opinion - a belief based not on positive knowledge but on what seems valid, true, or probable to one's own mind. It is time for cardiologists to do that with ABP. If we believe, as a group, that NICE has gone too far in recommending the abolition of ABP then we should act together as a responsible body of doctors robustly defending the Bolam principle and our right to clinical judgement

References

  1. Ramsdale DR, Turner-Stokes L. Prophylaxis and treatment of infective endocarditis in adults: a concise guide. Clin Med 2004;4:545-50.
  2. Gould FK, Elliott TS, Foweraker J et al. Guidelines for the prevention of endocarditis: report of the Working Party of the British Society for Antimicrobial Chemotherapy. J Antimicrob Chemother 2006;57:1035-42.
  3. National Institute for Health and Clinical Excellence. Prophylaxis against infective endocarditis: NICE guidance. London: NICE, 2008. Available from: http://www.nice.org.uk/Guidance/CG64
  4. Oakley C, Somerville W. Prevention of endocarditis. Br Heart J 1981;45:233-5.
  5. Dental Protection. Antibiotic cover for dental procedures - frequently asked questions. Available from: http://www.dentalprotection.org/assets/documents/ 2008_DPL_FAQ_Antibiotic_Prophylaxis_0308.pdf
  6. Ramsdale DR, Egred M, Palmer ND, Chalmers JAC. Antibiotic prophylaxis to prevent infective endocarditis should be given to patients. Heart 2007;eletter. Available from: http://heart.bmj.com/cgi/eletters/93/6/753-a#1477
  7. Bolam v Friern Hospital Management Committee 1957. Available from: http://oxcheps.new.ox.ac.uk/casebook/Resources/BOLAMV_1%20DOC.pdf

21.11.08

Perioperative β Blockers in Patients Having Non-Cardiac Surgery: A Meta-Analysis

Date Posted: 11/18/2008
Author(s): Bangalore S, Wetterslev J, Pranesh S, Sawhney S, Gluud C, Messerli FH.
Citation: Lancet 2008;Nov 12:[Epub ahead of print].
Clinical Trial: No

Study Question: What is the published evidence regarding perioperative β-blockers in patients undergoing noncardiac surgery?

Methods: The authors performed a meta-analysis of randomized controlled trials of β-blocker use in noncardiac surgery. The endpoints of interest were 30-day all-cause mortality, cardiovascular mortality, nonfatal myocardial infarction, nonfatal stroke, and heart failure. The authors followed the recommendations from the Cochrane Collaboration and the Quality of Reporting of Meta-analyses guidelines.

Results: The authors included 33 trials with 12,306 subjects. Taken together, these trials suggested no effect of β-blockers on all-cause mortality, cardiovascular mortality, or heart failure, but β-blockers were associated with a decrease (odds ratio [OR], 0.65; 95% confidence interval [CI], 0.54-0.79) in nonfatal myocardial infarction (number needed to treat [NNT] 63) and decrease (OR, 0.36; CI, 0.26-0.50) in myocardial ischemia (NNT 16). However, β-blockers were associated with an increase (OR, 2.01; CI, 1.27-3.68) in nonfatal strokes (number needed to harm 293). Sensitivity analysis suggested that increased risk of stroke was driven by the very large POISE trial, but that the decrease in nonfatal MI and myocardial ischemia were not. Sensitivity analysis also suggested that in patients undergoing high-risk surgery, those receiving β-blockers had decreased all-cause mortality (OR, 0.37; CI, 0.18-0.77).

Conclusions: The authors concluded that the evidence does not support the use of β-blockers for the prevention of perioperative clinical outcomes in patients having noncardiac surgery. They also opine that the American College of Cardiology/American Heart Association (ACC/AHA) should soften their advocacy for this intervention until conclusive evidence is available.

Perspective: This meta-analysis has two sources of bias not addressed by the authors. One is that these 33 trials used markedly different β-blocker regimens, and markedly different patient populations. This makes it very difficult to make a blanket statement about β-blocker therapy. Second, a single study contributed 68% of the subjects in this meta-analysis, possibly skewing the results, as their sensitivity analysis suggests. That one study, POISE, used a regimen of metoprolol CR 200 mg daily without a run-in phase to assure appropriateness or tolerance of therapy. Finally, the authors’ conclusions greatly oversimplify their observations. (The ACC/AHA guidelines do not advocate β-blocker therapy, but rather advocate very selective, tailored β-blocker therapy in a small subset of highest risk patients undergoing high-risk surgery.) This meta-analysis includes trials of widely varying—sometimes high-dose—β-blocker regimens in a wide range of patients, many of whom are low-risk undergoing low-risk surgery. Unfortunately, this meta-analysis therefore merely summarizes the fact that much remains to be learned about the appropriate use of perioperative β-blocker therapy. The authors’ sweeping conclusions oversimplify the data and the discussion.  James B. Froehlich, M.D., F.A.C.C.

17.11.08

Beta-bloqueadores no perioperatório de intervenções cirúrgicas não cardíacas – os novos dados do estudo POISE

No dia 13 de maio a revista britânica The Lancet publicou, em seu site os resultados do estudo POISE e com isso iniciou um intenso debate que envolveu médicos, repórteres e pacientes. O estudo POISE é, até agora, o maior estudo clínico já realizado para investigar o papel dos beta-bloqueadores no perioperatório de intervenções cirúrgica não-cardíacas. Os mais de 8.000 indivíduos incluídos foram aleatorizados para receber metoprolol ou placebo. É importante salientar que somente as intervenções cirúrgicas eletivas foram analisadas e pacientes que já faziam uso de beta-bloqueador por outras razões, não foram incluídos neste estudo. Com relação aos desfechos cardiovasculares, como morte cardíaca e infarto não fatal, o POISE revelou resultados semelhantes aos estudos anteriores com menos pacientes: o grupo que recebeu metoprolol apresentou incidência de complicações significativamente menor do que o grupo controle. Por outro lado, o que chamou a atenção dos investigadores foi o resultado da análise dos desfechos secundários, morte por todas as causas e acidente vascular cerebral (AVC). Nesta análise, os pacientes que receberam metoprolol apresentaram taxas maiores de complicações. Segundo os autores, a hipotensão e a bradicardia, mais frequentes no grupo que recebeu metoprolol, teriam sido responsáveis pela maior ocorrência de complicações, em especial AVC. A interpretação desses dados fez os investigadores do POISE concluírem que o uso de metoprolol no ambiente perioperatório é capaz de reduzir a chance de complicações cardiovasculares, MAS a um custo muito elevado: aumento da chance de morte ou de AVC. Os autores do trabalho acrescentaram que as recomendações relativas ao uso de beta-bloqueadores contidas nas diretrizes de tratamento perioperatório deveriam ser reformuladas. O editorial que acompanha o artigo recomenda, entretanto, cautela com relação a esta decisão. Aponta problemas com relação à escolha da dose de metoprolol adotada pelo estudo POISE (100 mg na primeira dose, atingindo 200 mg por dia) ou seja, 50% da dose máxima permitida para esse medicamento. Segundo o editorial, esta dose é muito mais alta do que a utilizada em estudos anteriores, o que poderia explicar a ocorrência de hipotensão e bradicardia. De fato, a análise dos dados do POISE, incluindo o material adicional oferecido pelos autores e disponível no site da revista, revela que não foi desprezível o número de pacientes que desenvolveu hipotensão e bradicardia. Hipotensão e bradicardia, embora possam representar complicações potencialmente graves, quando prontamente reconhecidas e tratadas por meio de suspensão do beta-bloqueador e medidas para elevação da freqüência cardíaca e da pressão arterial, não estão associadas a elevações significativas de taxas de complicações. Estas conclusões provêm de estudos com pacientes na fase aguda do infarto agudo do miocárdio onde os beta-bloqueadores têm seu benefício comprovado, mesmo numa situação onde a hipotensão e bradicardia poderiam reduzir perfusão coronariana e aumentar o tamanho do infarto. Como lidar então com as informações do POISE aparentemente contraditórias aos conceitos arraigados e, mais importante, em conflito com a fisiopatologia das complicações cardiovasculares e com os mecanismos de cardio-proteção dos beta-bloqueadores? Mais uma vez, com cautela. Aqui vão algumas recomendações:

1. Os indivíduos em uso prévio de beta-bloqueador não foram incluídos no POISE. Este indivíduos NÃO devem ter o beta-bloqueador suspenso antes de intervenção cirúrgica não cardíaca.

2. TODOS os indivíduos que fazem uso de beta-bloqueadores no perioperatório de intervenções cirúrgicas não cardíacas devem ser rigorosamente monitorizados com relação à ocorrência de hipotensão e bradicardia. Caso uma destas complicações seja diagnosticada, o medicamento deve ser prontamente suspenso e devem ser estabelecidas medidas para sua correção.

3. Enquanto aguardamos análise mais detalhada dos dados do estudo POISE, recém publicado, as recomendações relativas ao uso de beta-bloqueadores no perioperatório de intervenções cirúrgicas não cardíacas devem ser mantidas.

Bruno Caramelli
Daniela Calderaro
Pai Ching Yu
Danielle Menosi Gualandro
Andre Coelho Marques
Comissão de Avaliação Perioperatoria da SBC 

Manejo peri-operatório de pacientes usuários de anticoagulantes orais

                                                                                                        Renata Lopes Diaz Rocha

INTRODUÇÃO

Os anticoagulantes orais (cumarínicos) são drogas antagonistas da vitamina K que impedem a carboxilação dos fatores II, VII, IX e X (dependentes da vitamina K), sendo freqüentemente prescritas em todo mundo devido a sua ação efetiva na profilaxia dos fenômenos tromboembólicos. Assim, pacientes portadores de fibrilação atrial crônica, prótese valvar mecânica, estenose carotídea, doença coronariana, síndrome do anticorpo antifosfolípide ou, que apresentam antecedentes de trombose venosa profunda, tromboembolismo pulmonar e acidente vascular cerebral isquêmico, comumente fazem uso de tais fármacos pelo elevado risco de fenômenos tromboembólicos que apresentam.

Devido à elevada prevalência das doenças cardiovasculares e ao envelhecimento da população, o número de usuários de varfarina (cumarínico mais prescrito) vem crescendo (estima-se que na América do Norte 1 milhão de pessoas façam uso cronicamente 1), e ocasionalmente pacientes anticoagulados cronicamente necessitam de procedimentos cirúrgicos, visto que a maior parte são indivíduos com mais de 65 anos, representando uma população com duas vezes mais chance de requerer algum procedimento cirúrgico 1. Dessa forma, esses pacientes exigem um manejo peri-operatório de acordo com o risco de tromboembolismo do paciente e com o risco de sangramento inerente à operação, com o objetivo de evitar grandes hemorragias no trans e pós-operatórios, sem aumentar o risco de fenômenos tromboembólicos.

Vê–se comumente diferentes estratégias no manejo desses pacientes, como a simples parada na administração do anticoagulante oral, em pacientes com menor risco de tromboembolismo, ou a introdução de esquema anticoagulante com heparina não fracionada ou heparina de baixo peso molecular no lugar do cumarínico 2. No entanto, existem poucos estudos prospectivos a longo prazo que definam quando e como os cumarínicos devem ser suspensos e re-introduzidos e quando e como o esquema com heparina não fracionada ou heparina de baixo peso molecular deve ser realizado, dificultando a definição de um manejo para uso prático 1.

 

Avaliação do risco de tromboembolismo

Para avaliar o risco de tromboembolismo do paciente se suspensa a terapia anticoagulante oral deve-se em primeiro lugar considerar a indicação da terapia anticoagulante e então estratificar os pacientes em alto, moderado e baixo risco de acordo com as fatores que agravam o risco em cada uma das indicações, com o intervalo de tempo desde a ocorrência de um evento tromboembólico e com as comorbidades.

 

Fibrilação atrial

O risco anual de tromboembolismo em pacientes com fibrilação atrial, sem uso de medicação anticoagulante é de 4,5% 3. A presença de disfunção ventricular, disfunção valvar, cardiopatia isquêmica, hipertensão, diabetes, idade avançada e a história de evento tromboembólico, principalmente se ocorrido há menos de 30 dias, aumenta em diferentes níveis o risco de tromboembolismo. Os pacientes com fibrilação atrial podem ser então divididos nos dois grupos de acordo com os fatores 1,3:

 

Alto risco:

• Evento tromboembólico há menos de 30 dias

• Doença da válvula mitral

 

Moderado risco:

• Mais de 75 anos de idade

• História de tromboembolismo

• Cardiopatia isquêmica

• Disfunção ventricular esquerda

• Dilatação do átrio esquerdo

• Hipertensão

• Diabetes

 

Válvulas cardíacas mecânicas

Pacientes portadores de válvulas cardíacas mecânicas têm um risco de tromboembolismo arterial de 8% ao ano sem tromboprofilaxia, sendo esse risco reduzido para menos de 2% com a anticoagulação 3. Tais pacientes são apenas divididos em alto risco e médio risco, não se considerando de baixo risco nenhum portador de válvula mecânica. Foi observado que as próteses mitrais, a válvula de Starr-Edwards, de Bjork-Shiley e as válvulas de um só folheto são as mais trombogênicas, as primeiras devido à grande estase vascular na região 1,4. Assim como na fibrilação atrial, são considerados todos os fatores que podem aumentar o risco de tromboembolismo 1,3:

 

Alto risco 3:

• Evento tromboembólico prévio

• Troca valvar recente (menos de 90 dias)

• Mais de uma prótese

• Prótese mitral

• Prótese de um só folheto

• Trombo mural

• Fibrilação atrial

• Disfunção do ventrículo esquerdo

• Gravidez

 

Risco moderado 3:

• Prótese de dois folhetos

• Biopróteses colocadas há mais de 90 dias

 

Trombose venosa profunda e tromboembolismo pulmonar

Existem poucos dados estatísticos sobre o risco de recorrência no caso de suspensão do warfarin 1, no entanto sabe-se que há relação com a etiologia da doença, sendo nos casos idiopáticos maior a chance de recorrência (10-27% ao ano), e com o período desde a ocorrência do evento (menor de 30 dias) sendo de 40% ao ano o risco de recorrência 3.

Cirurgias de grande porte aumentarão o risco independente de outros fatores devido à imobilização que requerem, por esse motivo, se eletivas, devem ser postergadas até que tenham sido realizados três meses de tratamento anticoagulante, pois nesse caso o risco de recorrência decresce para 5% 3.

Alto risco 3:

• Evento tromboembólico há menos de 30 dias

 

Moderado risco 3:

• Evento tromboembólico há menos de 3 meses

• Obesidade

• Neoplasia maligna

• Imobilidade pós-operatória

 

Baixo risco 3:

• Evento tromboembólico há mais de 3 meses, sem outros fatores de risco

• Presença de outros fatores de risco, sem história de tromboembolismo

 

Avaliação do risco de sangramento

Estratificados os pacientes em alto, moderado e baixo risco de tromboembolismo em caso de suspensão da terapia com warfarin, será então realizada a categorização dos procedimentos quanto ao risco de sangramento anormal na vigência de anticoagulação, com o objetivo de prevenir perda intra-operatória exagerada, hematomas e conseqüentemente infecções, instabilidade hemodinâmica, além de outras complicações dependendo da extensão e local do sangramento 3.

Existem procedimentos que apesar de uma adequada técnica cirúrgica, estão freqüentemente associados à sangramento pós-operatório considerável. São exemplos a cirurgia de revascularização miocárdica, procedimentos urológicos, particularmente devido à presença da enzima uroquinase no epitélio desses órgãos. A biópsia renal percutânea é considerada um procedimento de alto risco pois no eventual sangramento, este é silencioso, dificultando a detecção. Pacientes diabéticos ou em uso de corticosteróides podem elevar o risco de sangramento pós-operatório anormal nas cirurgias de ressecções intestinais, pois apresentam maior dificuldade na cicatrização das anastomoses. As neurocirurgias são consideradas de alto risco devido às graves conseqüências da hemorragia no sítio cirúrgico.

 

Procedimentos de alto risco 1:

• Neurocirurgias

• Prostatectomia, cirurgias vesicais

• Troca de válvula cardíaca, revascularização miocárdica e cirurgias vasculares de grande porte

• Polipectomia intestinal

• Biópsia renal

• Excisão de grandes tumores

 

Procedimentos de médio risco 1:

• Cirurgias intrabdominal de grande porte

• Cirurgias intratorácica de grande porte

• Cirurgias ortopédicas de grande porte

• Inserção de marcapasso cardíaco

 

Procedimentos de baixo risco 1:

• Herniorrafias

• Colecistectomia laparoscópica

• Biópsia prostática 5

• Extrações dentárias não complicadas 5

• Cirurgia para catarata

• Procedimentos dermatológicos

• Cateterismo cardíaco

• Esofagogastroduodenoscopia e colonoscopia com biópsia

• Artrocentese, paracentese, toracocentese

 

Conduta no pré-operatório

Inicialmente, definiremos se a terapia com o warfarin deverá realmente ser suspensa, mantida ou ter suas dosagens reduzidas. Por exemplo, pacientes que serão submetidos a procedimentos com baixo risco de sangramento, não necessitam da suspensão do medicamento 3. Essa medida tem importância pois estudos demonstram que a freqüente suspensão da terapia anticoagulante para a realização de procedimentos odontológicos está associada a ocorrência de fenômenos tromboembólicos sendo o risco 4 vezes maior que o de ocorrência de hemorragia. Além disso, foi provado que endoscopias digestivas com ou sem biópsia, operação de catarata, artrocentese e extrações dentárias não estão relacionadas a hemorragias graves mesmo na vigência de anticoagulação oral. Assim, procedimentos em que a continuidade da terapia cause sangramentos controláveis apenas com medidas locais não requerem parada da administração dos anticoagulantes orais 5.

Salientamos a importância da monitoração do tempo de protrombina (TP) e do INR (international normalizaded ratio) na avaliação pré-operatória, pois os pacientes que serão submetidos à procedimentos de baixo risco, devem encontrar-se dentro da faixa terapêutica que em geral é de 2,0 a 3,0 (ou 4,0 dependendo da indicação) para o INR e de 2 a 2,5 vezes o controle para o TP. Entretanto, procedimentos com maior risco de sangramento, requerem valores de TP/INR dentro ou próximos aos normais 5. Dessa forma, além do controle periódico rigoroso, deve ser obtido TP/INR no dia em que o warfarin for suspenso (se for esse o caso) e no dia da operação, pois os cumarínicos demoram a ter seu efeito revertido.

Confirmada a necessidade de suspensão do anticoagulante oral, esta deve ser iniciada 5 dias antes do procedimento, o que permitirá que o INR chegue a 1,5 no dia da operação, e o paciente deve ser orientado a parar o uso de anti-agregantes plaquetários 7 dias antes 1. Avaliaremos então, a necessidade de introdução de terapia anticoagulante alternativa com heparina não fracionada ou heparina de baixo peso molecular.

Alguns autores acreditam que o risco de tromboembolismo é superestimado, e pacientes de baixo risco para eventos tromboembólicos não necessitam da terapia alternativa 5. Entretanto, deve-se levar em consideração o estado de hipercoagulabilidade causado pela própria operação (causando aumento dos níveis de plasminogênio) e pelo aumento rebote da trombina após cessar o efeito anticoagulante 7.

Estabeleceu-se então que pacientes com alto risco para eventos tromboembólicos têm fortemente recomendada a tromboprofilaxia e em casos com moderado risco esta deve ser considerada, avaliando-se o probabilidade de sangramento inerente ao procedimento. Em pacientes de baixo risco, a terapia é opcional (Tabela 1).

 

Tromboprofilaxia com heparina de baixo peso molecular

A heparina de baixo peso molecular (HBPM), apresenta vantagens em relação às HNF por ser segura, tendo uma dose fixa calculada através do peso, apresentando níveis séricos previsíveis após a injeção subcutânea, pouca ligação à proteínas plasmáticas, não exigindo monitoração laboratorial, pois atua inibindo o fator X porém com menor inibição da trombina e por permitir o uso no domicílio.

Deve-se iniciar a tromboprofilaxia quando o INR encontrar-se abaixo da faixa terapêutica, ou seja se a faixa terapêutica for de 2,0 a 3,0 inicia-se a HBPM quando o INR for menor que 2,0. Como essa abordagem requer obtenções diárias do INR, empiricamente, inicia-se a HBPM após 1 ou 2 dias sem o uso da warfarina. A HBPM pode ser administrada 1 ou 2 vezes ao dia, a última dose deve ser administrada 12 a 24 horas antes da cirurgia e a re-introdução 24 a 72 horas depois dependendo do risco de sangramento 1,3.

 

Tromboprofilaxia com heparina não fracionada

A tromboprofilaxia com heparina não fracionada (HNF) requer internação 3 a 4 dias antes e 3 a 4 dias depois do procedimento, devida a variabilidade de respostas à terapia, exigindo portanto ajustes freqüentes de acordo com os valores de TTPA (tempo de tromboplastina parcial ativada). O seu uso está indicado em pacientes com elevado risco de tromboembolismo e elevado risco de sangramento cirúrgico ou em pacientes que tenham apresentado evento tromboembólico a menos de 30 dias. A HNF tem a vantagem de ter seu efeito facilmente revertido pelo o sulfato de protamina ao contrário da heparina de baixo peso molecular que é revertida apenas em 60%. A HNF deve ser suspensa 4 horas antes do procedimento e re-introduzida 12 a 24 horas depois 1,3.

 

Abordagem da tromboprofilaxia

A forma de tromboprofilaxia será então determinada de acordo com os fatores de risco. Em todos os casos o warfarin é suspenso 5 dias antes do procedimento e a tromboprofilaxia iniciada 4 dias antes. É obtido no dia anterior o valor do INR, e se este for maior que 1,5 poderá ser administrada uma pequena dose de vitamina K e a medida deverá ser repetida na manhã da operação. Se caso o INR ainda encontrar-se maior que 1,5, o cirurgião poderá optar por modificar a técnica cirúrgica, corrigir o INR com plasma fresco congelado, postergar a cirurgia, ou até mesmo assumir o risco junto com o paciente de realizar a operação nessa condição 3.

Evento tromboembólico há menos de 30 dias: se possível deve-se postergar o procedimento, do contrário o warfarin é suspenso e o paciente internado 4 dias antes para início da tromboprofilaxia intravenosa com heparina, sendo esta suspensa 4 horas antes e reiniciada 12 a 24 horas depois da operação 1.

Presença de outros fatores de alto risco para eventos tromboembólicos: enoxeparina na dose de 1 a 1,5mg/kg/dia, dependendo do número de fatores de risco, havendo intervalo de 24 horas entre a última dose e o procedimento cirúrgico 1.

Pacientes com moderado risco de eventos tromboembólicos: enoxeparina a 40mg/dia, com um intervalo de 12 horas entre a última dose e a operação 1.

Pacientes com baixo risco de eventos tromboembólicos: enoxeparina 20mg/dia, com 12 horas de intervalo entre a última dose e o procedimento 1.

A tromboprofilaxia pode ser recomeçada, na mesma dosagem, de 12 a 48 horas após o procedimento cirúrgico até que o INR encontre-se dentro da faixa terapêutica, e a warfarina seja re-introduzida 1,3 (Tabela 2).

 

Pacientes que apresentam hemorragia no pós-operatório

A conduta na ocorrência de sangramento anormal no pós-operatório dependerá da causa, do volume e do sítio da hemorragia, sendo em geral a tromboprofilaxia suspensa. Entretanto, realizado adequado controle, esta poderá ser re-iniciada 24 horas depois. Situações como hemorragias intracranianas e intestinais, no entanto, requerem maior tempo de suspensão, as primeiras devem ser acompanhadas radiológicamente para que se avalie a possibilidade de re-introdução.

 

Re-introdução do anticoagulante oral

A re-introdução do cumarínico pode ser realizada na noite após o procedimento pois o efeito anticoagulante mínimo da warfarina é obtido somente 24 horas depois da dose inicial e o efeito terapêutico dá-se com 4 a 5 dias de uso da medicação.

 

Conclusões

A definição de uma abordagem peri-operatória dos pacientes em uso de anticoagulantes orais tem importância pois a má condução desses casos pode culminar com sangramentos pós-operatórios fatais ou fenômenos tromboembólicos catastróficos.

Ressaltamos a importância da avaliação da necessidade de interrupção do uso do cumarínico e, da introdução da tromboprofilaxia com heparina, sendo esta última de grande utilidade pois permite anticoagulação peri-operatória sem que haja no momento do procedimento as alterações de difícil reversão no TP/INR causadas pelos cumarínicos. Nesse contexto, destaca-se a heparina de baixo peso molecular por não necessitar de controle laboratorial rigoroso permitindo seu uso em ambiente extra-hospitalar.

Como foi exposto, procedimentos com baixo risco de sangramento não exigem interrupção da warfarina, desde que o INR encontre–se dentro da faixa terapêutica. Em procedimentos de moderado e alto risco espera-se um valor de INR menor que 1,5 para execução do procedimento com segurança.

Portanto, sendo adequadamente avaliados os riscos, havendo rigorosa monitoração do TP/INR e TTPA (se estiver sendo utilizada heparina não fracionada) e utilizando-se corretamente os esquemas anticoagulantes com heparina, minimizaremos as potenciais complicações pós-operatórias desses pacientes.

Tabela 1: Conduta no pré-operatório de pacientes usuários de anticoagulantes orais, de acordo com o risco cirúrgico de sangramento e o risco de tromboembolismo do paciente

 

REFERÊNCIAS

1- Douketis J.D. Perioperative management in patients who are receiving oral anticoagulant therapy: a practical guide for clinicians. Thrombosis research. 2003; v. 180: p. 3-13.

2- Dunn A.S., Turpie G.G.A. Perioperative management of patients receiving oral anticoagulants. Arch intern med. 2003; v. 163: p. 4-28.

3- Watts S. A., Gibbs N.M. Outpatient management of the chronically anticoagulated patient for elective surgery. Anaesthesia and intensive care. 2003; v. 31: p. 145-154.

4- Alexander R., Ferreti A.C., Sorensen J.R. Stop the nonsense not the anticoagulants: a matter of life and death. Editorial, NYSDJ. 2002.

5- Marietta M., Bertesi M., Simoni L., Pozzi S., Castelli I., Cappi C. A simple and safe nomogram for the management of oral anticoagulation prior to minor surgery. Clin. Lab. Haem. 2003; v. 25: p. 127-130.

6- Shapira Y., Vaturi M., Sagie A. Anticoagulant management of patients with mechanical prosthetic valves undergoin non-cardiac surgery: indications and unresolved issues. Heart valve dis. 2001; v. 10: p. 380-387.

7- Genewein U., Haeberli A, Straub P.W., et al. Rebound after cessation of oral anticoagulant therapy: the biochemical evidence. Br. J. Hematology. 1996 ; v. 92: p. 479-485.

8- Lourenço M.D., Lopes L.H.C., Vignal, Morelli V.M. Avaliação clínica e laboratorial de pacientes em uso de anticoagulantes orais Arq Bras Cardiologia. 1997;v. 68: p. 353-356.

9- Goodman, L.S. et al. Goodman e Gilman: Bases farmacológicas da terapêutica. Trad: Vorsatz, 10° ed. Rio de Janeiro: Mc Graw Hill. 2003; cap 55: p. 1146-1150. 

Existe risco doutor?

Antigamente, classificava-se o risco de alguma coisa não sair bem em uma cirurgia comoRISCO 1-2-3...etc., de acordo com a magnitude da cirurgia. Assim, uma extração de unha, por exemplo, poderia ser classificada como de risco 1. Já uma cirurgia sobre o coração ou pulmão, seria de risco máximo, ou seja, risco 4.

Porém, observou-se que uma cirurgia pequena feita em uma pessoa com más condições físicas, poderia ter conseqüências graves ( um enfarte de miocárdio por exemplo em paciente que se submeteu a uma drenagem de abcesso ). A partir de então, o estado de saúde do paciente passou a fazer parte da avaliação.

Mesmo uma pequena cirurgia feita em um paciente em excelentes condições físicas, porém num ambiente hospitalar contaminado, com material inadequado, cirurgião inexperiente,anestesiologista descuidado, pessoal de enfermagem sem treinamento, ausência de serviço de suporte ( UTI, laboratórios, banco de sangue, etc.) tem grande chance de ter morbilidadee/ou mortalidade bastante aumentada.

Atualmente todos esses fatores participam da avaliação do assim chamado RISCO CIRÚRGICO.

Se vocês observaram NÃO SE FALA EM RISCO ZERO.

Existem fatores imponderáveis como reações alérgicas a medicamentos, reações idiossincrásicas ( ex: um medicamento é utilizado para controlar a pressão arterial, mas para aquele paciente produz convulsões - não se trata de reações colaterais do remédio pois no estudo do mesmo nunca houve esse tipo de reação ), hipersensibilidade de alguns órgãos a determinadas situações, que podem também interagir e influir no RISCO CIRÚRGICO.

Quando me perguntam " existe risco doutor " e as condições daquele paciente são ótimas e a cirurgia é simples, eu respondo " é o mesmo risco que sofro de não chegar ileso em minha casa hoje ", isto é, o risco é muito pequeno, mas eu não estou no controle de todos os fatores que poderiam por exemplo, serem responsáveis por uma possível intercorrência com meu carro.

Outras vezes, comparo um ato anestésico-cirúrgico, a uma viagem que faremos com nosso carro. Se o motorista é cuidadoso e hábil, o carro está nas melhores condições possíveis, isto é, revisado, abastecido, pneus bons, a estrada é asfaltada e sem buracos, poucas razões existem para que essa viagem não seja boa. Mas...não estou livre de um motorista cansado durma ao volante e atravesse a pista podendo me abalroar......!!!!

Fonte: DR. JOSÉ MAURICIO PEREIRA ASSEF - TSA/CSA - MÉDICO ANESTESIOLOGISTA DA SANTA CASA DE MARÍLIA - GRADUDO PELA FACULDADE DE MEDICINA USP - SÃO PAULO